Estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) chama a atenção para a dimensão ainda gigantesca da violência sexual que afeta principalmente as mulheres no Brasil.
Estudo publicado nesta semana pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) chama a atenção para a dimensão ainda gigantesca da violência sexual que afeta principalmente as mulheres no Brasil: o número estimado de crimes de estupro no país é de 822 mil por ano – o equivalente a dois por minuto. A maior quantidade desse crime é cometido contra jovens, com o pico de idade aos 13 anos.
O Ipea se baseou em dados da Pesquisa Nacional da Saúde (PNS), do IBGE, e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, tendo 2019 como ano de referência. Assim, o instituto também calculou a proporção dos casos estimados de estupro que não são identificados nem pela polícia, nem pelo sistema de saúde. A conclusão é que, dos 822 mil casos por ano, apenas 8,5% chegam ao conhecimento da polícia e 4,2% são identificados pelo sistema de saúde. Com este cenário, a estimativa de 822 mil estupros por ano pode ser considerada conservadora, avaliam os responsáveis pela pesquisa. “O registro depende, em boa parte dos casos, da decisão da vítima, ou de sua família, por buscar ajuda no Sistema Único de Saúde”, disse, em nota, o pesquisador do Ipea e um dos autores do estudo, Daniel Cerqueira.
Em razão disso, prossegue, o número de casos de estupro notificados difere “substancialmente da prevalência real, pois muitas vítimas terminam por não se apresentar a nenhum órgão público para registrar o crime, seja por vergonha, sentimento de culpa, ou outros fatores”.
“O quadro é grave. Além da impunidade, muitas das vítimas ficam desatendidas em termos de saúde”, afirma o Ipea. As consequências da violência sexual contra as mulheres são igualmente dramáticas. Entre as mais frequentes estão a depressão, a ansiedade, impulsividade, distúrbios alimentares, sexuais e de humor e alteração na qualidade de sono. Além de ser um fator de risco para comportamento suicida.
JUVENTUDE MARCADA
Outra pesquisa sobre o tema, divulgada por ocasião da chegada de março – período de afirmação das lutas pelos direitos das mulheres –, traça com detalhes o perfil das vítimas de violência sexual no Brasil entre meninas e adolescentes dos 10 aos 19 anos. O estudo Sem deixar ninguém para trás – gravidez, maternidade e violência sexual na adolescência foi organizado pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs), vinculado à Fundação Oswaldo Cruz da Bahia (Fiocruz-BA).
Os institutos concluem que a maioria (67%) dos 69.418 estupros cometidos no país entre 2015 e 2019 teve como vítimas meninas com idade entre 10 e 14 anos. Outros 33% das vítimas tinham de 15 a 19 anos. Prevalecem as meninas pardas (54,75%). Depois delas vêm as brancas (34,3%), pretas (9,43%) e, por fim, indígenas (1,2%). O Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA) e o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) também assinam a pesquisa, que confirmou dados levantados pelo trabalho do Ipea quanto às relações entre agressores e vítimas de estupro, identificados em quatro grupos principais:
amigos/conhecidos;
familiares;
parceiros e ex-parceiros;
e desconhecidos.
Outro aspecto confirmado por ambos os trabalhos: a esmagadora maioria das vítimas conhecia o autor, ou autores, do crime que sofreu. Apenas 17,2 % das ocorrências registradas foram cometidas por pessoas desconhecido das mulheres.Por meio dos dados coletados junto ao Sinan, do Ministério da Saúde, os pesquisadores concluíram ainda que o estupro nestas faixas etárias costumam ocorrer na casa das vítimas. No total, 63,16% dos episódios se deram nesse contexto. Em 24,8% das vezes, o local era público e, em 1,39% dos casos, o crime foi cometido dentro da escola.
“Estamos falando de agressores conhecidos, pessoas que muitas vezes também provêm coisas boas, positivas para essas crianças. Por isso é que é tão importante cuidar disso, porque a gente está falando de algo que é tratado pelo agressor sexual como um segredo, algo que não pode ser contado”, alerta a psicóloga Daniela Pedroso, gestora do projeto Bem Me Quer, do Hospital da Mulher.
Fonte: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/brasil-terra-da-violencia-sexual-822-mil-estupros-por-ano-dois-por-minuto/